Peter acordou animado para rever o avô e colocar os assuntos
em dia.
Fazia um mês que seu avô tinha ido à Alemanha, visitar um
amigo, e naquele dia Peter poderia finalmente acabar com a saudade. Mas em vez
de Charlie aparecer na porta com seu imenso sorriso, foi o telefone que Peter
teve que atender.
— É a casa dos Matthews? – Ele concordou. — O Sr. Andrew
está? – A voz perguntou e Peter chamou por seu pai.
Ele pegou o telefone ao lado da esposa e começou a assentir e
menear a cabeça, enquanto ouvia atentamente o que o homem dizia. Ao fim da
conversa, encarou a esposa e o filho de olhos arregalados.
— Charlie faleceu... — sussurrou desolado.
Emma tentava consolar o marido o quanto podia, enquanto Peter
conversava com o primo no quarto.
— Eu sei que Charlie nunca controlou muito bem sua diabetes,
mas... Nunca imaginei que isso seria a causa de sua morte — lamentou. — Tudo
aconteceu tão rápido...
— O que seus pais vão fazer agora? — Thomas perguntou.
— Eles ainda não sabem, mas é provável que tenham que ir pra
Alemanha resolver as coisas e trazer o... – hesitou por instantes – corpo pra
cá.
Depois de dois dias, seus pais decidiram ir para Alemanha,
mas Peter teria que ficar. Ele pensou em contestar e pedir para acompanhá-los,
mas no fundo sabia que fazer aquela viagem não o ajudaria, e talvez a companhia
constante do primo, já que teria que morar com ele até seus pais voltarem, o
fizesse se esquecer da dor.
Seu relacionamento com o avô era como de um segundo pai, e
sua perda era algo que Peter não podia aceitar. E, apesar de tentar esconder,
todos podiam ver que ele não estava bem.
Melina, tia dos meninos, ao saber da morte de Charlie, foi
visitá-los e fazer um convite.
— Vim convidá-los para passar férias inesquecíveis na ilha
Hamilton. No qual, euzinha aqui, sou a mais nova zeladora. Ah, tudo pago por
minha conta! – disse animada.
Melina tinha 32 anos, mesmo que Peter a considerasse mais
jovem que ele. Era sempre animada e pronta para novas aventuras. Uma delas
levou a fazer um teste, e ser chamada para trabalhar como zeladora da ilha
Hamilton, na Austrália.
Diferente dela, Peter nunca foi considerado imaturo, tinha a
cabeça no lugar e era a voz da razão entre os amigos. Bem, quase sempre. Como
todo garoto de 16 anos, Peter gostava de saber quais eram seus limites, tanto
quanto ultrapassá-los.
Era considerado um garoto bonito na escola, com um grupo de
amigos fisicamente privilegiados. Nem todos eram do time de futebol, mas a
maioria estava sempre com “companhia”.
Seu cabelo castanho claro e olhos cor de mel-esverdeado,
herdados de sua avó, faziam sucesso entre as garotas. Já Thomas, tinha cabelos
castanhos e olhos da mesma cor, “um garoto normal” como ele mesmo dizia, porém
ambos tinham a altura mediana.
Era época de férias, mas os pais de Thomas logo voltariam ao
trabalho, e apenas os garotos iriam com Melina.
A viagem durou exaustivas 20 horas. Durante o tempo que não
dormiam, Melina contava todos os detalhes da ilha e os deixava cada vez mais
ansiosos para chegar.
Ao desembarcarem pela manhã, pegaram um barco que os levou
direto à ilha.
A paisagem era perfeita. O Sol era refletido no mar de águas
esverdeadas e tão claras, que era possível verem os peixes e o fundo de areia
branca. Um perfeito Oasis.
Quando chegaram, foram recebidos por Sam, um lindo golden retriever que fazia companhia a
Melina.
— Hey, Sam! – Peter se aproximou e brincou com o cachorro,
que deu dois latidos altos, parecendo animado.
Se hospedaram na casa de Melina, uma casa de madeira, grande
e aconchegante, com uma enorme varanda de frente para o mar.
Os meninos se acomodaram no quarto de hóspedes, que era
branco e estava bem arrumado com duas camas de solteiro.
— Não acredito que estamos nesse paraíso. — Thomas se jogou
na cama com os braços na nuca.
— Também não. – Peter murmurou.
A memória de Charlie não o deixara por toda a viagem de
avião, junto com a ideia de que tudo ainda fosse um longo pesadelo.
— Ah, cara, vamos lá! Ânimo! Tenho certeza que seu avô não
gostaria que você ficasse pra baixo desse jeito. – Thomas argumentou.
Peter se deitou na cama, fechou os olhos e suspirou.
Ele sabia que não seria fácil, mas prometeu a si mesmo que
tentaria seguir em frente – Ele tinha que seguir. E acabou cochilando.
Quando acordou, foram para a praia, onde ficaram até o
anoitecer.
Os dias não eram muito diferentes naquele Oasis pessoal, com
muito sol, praia, boa comida e sossego, não podiam pedir uma vida melhor. Até
Melina querer mostrar aos garotos uma ilhota próxima, onde gostava de passar o
tempo, observando o mar do alto de uma encosta. Peter concordou animado, mas
Thomas não gostou muito da ideia de fazer trilha.
Enquanto velejavam até a ilhota, Peter passou a mão na água
transparente sentindo o cheiro da água salgada. O céu estava azul com
pouquíssimas nuvens e havia um mormaço gostoso no ar. Ele sabia que nunca se
esqueceria daquela imagem, daquele ambiente, e se perguntou por um momento se o
paraíso seria assim.
Foram recebidos por um amontoado de rochas ao redor da praia,
que faziam com que o acesso à ilha ficasse restrito.
— Você tem que cuidar daqui também? – Peter perguntou
enquanto Melina pegava as mochilas.
— Não necessariamente, quase ninguém vem aqui, é realmente
deserta. Quando quero um tempo, venho pra cá com o Sam. — Ela afagou os lisos e
dourados pelos do cachorro, colocou sua mochila de trilha nas costas e foi em
direção à densa floresta. — Então, vamos?
Os meninos, principalmente Thomas, encheram a mochila com
muito mais coisas que o necessário, fazendo com que ambos andassem lentamente.
Ao entrarem na floresta, encontraram árvores grandes de
troncos envelhecidos, que pareciam ter mais de 100 anos. Tudo era muito verde e
apenas um estreito caminho de terra os guiava.
O barulho dos pássaros e dos animais deixava Peter
incrivelmente feliz, aquilo era novo para ele. Viveu seus 16 anos no estado
mais industrial dos Estados Unidos e seu único contato direto com a natureza
era no Central Park, do qual já conhecia cada centímetro.
Ele não poderia ser considerado um natureba nato, mesmo
porque suas notas em Biologia não eram das melhores, mas diferente dos outros
garotos, ele gostava da natureza tanto quanto de seu videogame e seu
computador.
— Para onde estamos indo? – Thomas perguntou impaciente,
depois um tempo caminhando.
— Já está cansado, Thomas? – Melina caçoou. — Não se
preocupe, há um riacho aqui perto, podemos dar uma parada por lá.
Thomas estava realmente cansado, o único exercício que
costumava fazer era jogar videogame. Às vezes, se aventurava em jogar futebol
ou basquete, e acima disso, se mover do sofá a geladeira da cozinha. Mas ele
não era gordo, apesar de algumas meninas acharem isso. Já Peter, gostava de se
manter em forma. Amava praticar esportes, especialmente jogar futebol americano
aos domingos com o pai e Charlie.
Logo o som da água era audível, e avistaram o riacho que
brotava de uma pequena cascata. Eles tiraram as mochilas e se sentaram nas
pedras para se refrescar.
Depois de comer algumas frutas e com o pique de volta,
resolveram continuar.
— Podem ir, já alcanço vocês. — Melina disse enquanto
guardava as coisas na mochila.
Sam ficou com ela enquanto os meninos prosseguiam pelo
caminho mais visível.
— O que está fazendo? – Thomas perguntou a Peter, que mandava
uma mensagem de texto pelo celular. Incrivelmente, havia sinal por lá.
— Conversando com uma amiga.
— Quem? – perguntou malicioso.
— A Kate, amiga da Jessica – respondeu indiferente.
— Aquela que a Jess queria te apresentar? – Peter concordou.
— Ah... E ai? O que ela quer? — Se aproximou para ler o que Peter escrevia.
— Ela quer sair comigo, mas ainda estaremos aqui.
— Putz, que azar, cara. Mas tenho certeza que depois vocês se
encontram. – E suspirou. — Queria que a Anna me desse bola assim. Você é um
cara de sorte.
Peter balançou a cabeça rindo e quando terminou de recusar o
pedido de Kate, estancou, olhando fixo para uma espécie de entrada que traçava
uma nova trilha. As árvores pareciam se fechar no topo fazendo uma abertura e
dentro dela tudo parecia estar mais escuro.
Peter deu um passo na direção do novo caminho.
— Hã... Peter? Eu não sou muito fã de florestas escuras e
assustadoras. — Peter olhou para o primo, sorriu e ignorou seu aviso, indo na
direção daquela entrada sombria. — Hey, a Melina já vem vindo! — mentiu,
esperando que isso o fizesse parar. — Espera... — E foi atrás de Peter, que
adentrava a escuridão.
Quando passaram pela entrada, uma onda morna os atingiu e um
peso caiu sobre seus ombros. Eles se olharam, mas continuaram em frente.
Depois de um tempo caminhando naquela parte escura da
floresta, começaram a ver pessoas andando. Cada uma seguia seu próprio curso,
passando ao lado deles como se eles nem estivessem ali. Trajando roupas antigas
e desgastadas.
Thomas pegou a lanterna de sua mochila e tentou iluminar o
caminho, mas ela começou a falhar.
— Droga de lanterna! – retrucou batendo nela.
Peter estava tão fascinado com o lugar que nem notou a luz
que vinha detrás dele. Quando percebeu, se virou e tirou a lanterna da mão de
Thomas.
— Tá doido?! Eles vão perceber que estamos aqui! Essas caras
são estranhos... — E tentou desligar a lanterna.
— A Melina não disse que ninguém morava aqui?
— Devem ser nativos, sei lá, olha como estão vestidos, parece
que pararam no tempo. – Peter cochichou e voltou sua atenção a lanterna. Mas
pouco antes de conseguir desligá-la, seu feixe de luz atingiu uma enorme árvore
perto deles, que brilhou refletindo luz.
Os garotos olharam assustados para aquela árvore bizarra,
assim como as pessoas ao redor, que imediatamente notaram a presença deles.
— Acha que eles perceberam? – Thomas indagou.
— Não tenho dúvidas.
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